Ao
entrar em campo para o jogo de despedida do Estádio Rasunda, local da decisão da
Copa de 1958, nesta quarta-feira, em Estocolmo, contra a Suécia, a Seleção
Brasileira vestirá a camiseta azul. Foi assim, de azul, que o Brasil goleou os
próprios suecos por 5 a 2 na final do primeiro de seus cinco títulos mundiais. E
por que o Brasil não utilizou a camiseta amarela, tradicional, criada pelo
pelotense Aldyr Schlee para substituir a branca dos anos de derrotas?
É que juntou-se uma descortesia dos organizadores e a velha superstição do
futebol brasileiro, tão antiga quanto a primeira bola trazida ao país por
Charles Miller. Até aquele momento, o visitante tinha prioridade na escolha
(hoje, a Fifa decide por antecipação). Diante da intransigência dos suecos,
todos foram para o sorteio – e o Brasil perdeu, sendo obrigado a pensar em uma
camiseta reserva.
A história está contada em detalhes por Ruy Castro no excelente
Estrela
Solitária, um brasileiro chamado Garrincha. A primeira opção foi a camiseta
branca, mas quando isso foi sugerido aos jogadores, a comissão técnica percebeu
que muitos deles baixaram a cabeça, perturbados. Eles lembraram dos tempos de
derrotas, especialmente da Copa de 1950.
Vicente Feola, o técnico, e o supervisor Carlos Nascimento viram que todo um
trabalho organizado desde os primeiros dias poderia ruir por causa da cor da
camiseta.
Nem adiantava resistir porque a superstição começava pelo chefe da delegação,
Paulo Machado de Carvalho, o homem que usou o mesmo terno marrom em todos os
dias da Copa porque foi com ele que assistiu à primeira das vitórias da Seleção.
Carvalho também costumava segurar, conta Ruy Castro, uma imagem de Nossa Senhora
Aparecida, que levara do Brasil, durante os jogos.
Para completar, alguém lembrou na reunião que das cinco Copas anteriores,
quatro tinham sido vencidas por seleções usando camisetas azuis.
Pronto, estava definido.
Para animar os jogadores, sempre supersticiosos, Carvalho disse que
a Seleção
vestiria o “manto de Nossa Senhora Aparecida”. Faltava só encontrar as
camisetas. Nos mil quilos de material levados do Brasil, as únicas azuis eram de
treinos e tinham sido usadas. Mário Trigo, dentista, e Adolpho Marques,
integrantes da comissão técnica, decidiram procurar no comércio de
Estocolmo.
Encontraram camisetas semelhantes à da foto (que a Nike produziu
especialmente para este amistoso, inclusive com o antigo escudo). Na volta ao
hotel, elas foram entregues ao massagista Mário Américo que, auxiliado por
Francisco de Assis, passou a manhã de sábado arrancando escudos da então CBD e
números das camisetas amarelas e costurando-os nas azuis.
Se alguém olhar com atenção as fotos antigas dos campeões mundiais, verá que
em muitas das camisetas números e escudos estão enrugados ou prestes a cair –
tudo por causa da operação de emergência, com linhas e agulhas.
O Brasil goleou e venceu o título – e os supersticiosos ficaram
definitivamente convencidos de que a opção pelas camisetas foi tão decisiva,
quanto os gols de Vavá e Pelé ou os dribles de Garrincha.
MARCOS, Mario. Brasil veste a camiseta azul de 1958. A da superstição. Disponível em: http://mariomarcos.wordpress.com/2012/08/14/19931/ (acessado em 04/07/2014)